André
Lukamba
RESUMO
DA OBRA
São
quatro pequenos capítulos, nem sempre proporcionais,
dependendo da questão abordada.
O
primeiro fala do significado ambíguo de globalização,
que actua como aqueles fertilizantes que simultaneamente
matam os vermes e/ou o joio e fazem crescer e revigorar
o trigo ou outras plantas do campo. De facto, na
globalização, o fraco morre e isto dá fôlego ao rico
que se enriquece ainda mais. Trata-se de fazer comer
mais quem já é (excessivamente) obeso, e deixar morrer
à fome quem por sinal já não tem de comer. Em vez de
dividir bem a torta por todos, não; deve-se garantir a
parte do mais 'nutrido' (o rico) e aumentá-la com o
pouco que tocaria ao já desgraçado.
Por
ex., nos EUA 30% da população é obesa. Ainda nos EUA,
conta-se o caso de Christina Corrigan, de 13 anos, que
morreu de infarto por causa do seu peso: 330 kg! Na Itália
35% das crianças em idade escolar é obesa ou tem
excesso de peso. A nível mundial, os obesos são mais
de um bilhão, um em cada 6 pessoas. Algumas projecções
dizem que 83% das vendas de produtos farmacêuticos se
fazem nos EUA, na Europa Ocidental e no Japão, sendo o
medicamento mais vendido no mundo o de curar a indigestão.
Segundo
o Relatório UNDP de 1998, a opulência do Norte do
mundo gasta por ano (em US$): nos EUA 9 bilhões em cosméticos;
na Europa 11 bilhões em gelados; na Europa e EUA 12
bilhões em perfumes; nos EUA e na Europa 17 bilhões
para a comida de animais domésticos; no Japão 35 bilhões
para o tempo livre; na Europa 50 bilhões em cigarros;
ainda na Europa 105 bilhões vão para bebidas alcoólicas;
no mundo 400 bilhões vão para o consumo da droga e 780
bilhões para despesas militares. Os super-ricos vivem:
60 nos EUA, 60 no Japão, 21 na Alemanha. As três
pessoas mais ricas do mundo superam o PNB dos 48 países
menos desenvolvidos; 15 pessoas mais ricas têm uma
riqueza conjunta igual ao PNB de todos os países da África
subsahariana.
E,
diante de todo este escandaloso exibicionismo, 850 milhões
de pessoas no mundo inteiro não têm sequer de comer,
porque os ricos querem eles comer tudo sòzinhos!
Aparentemente,
os ricos do Norte e os pobres do Sul parecem adversários.
Todavia, mais do que adversários são os extremos de um
perverso mecanismo que um grupo de intermediários usa
para enriquecer-se: as multinacionais. Estas, com a
veste legal do País onde operam e, portanto, com todas
as vantagens ligadas às sociedades locais e às vezes
negadas às sociedades estrangeiras, são empresas
produtivas ou financeiras com uma estratégia que tem
dois objectivos: conquistar novos mercados e deslocar a
produção para lá onde as taxas, os custos de trabalho,
das matérias-primas e da energia eléctrica são mais
baixos.
Por
isso, o termo "globalização" tem um sentido
ambivalente: para alguns, trata-se de "um processo
inevitável dirigido pelas novas tecnologias no sector
das comunicações e dos transportes que permite às
informações, às pessoas, aos capitais e aos bens
ultrapassar as fronteiras dos Estados e atingir os
recantos mais distantes do globo numa velocidade até
hoje inimaginável. Tal processo estaria a transformar o
mundo numa aldeia global com consequências políticas e
mudanças económicas, que abrem possibilidades sem
precedentes de prosperidade para todos". Seria o
aspecto positivo! Para outros, pelo contrário, é
"um processo de dominação económica, política e
cultural dos fortes - económica e militarmente - sobre
os fracos do mundo". É o aspecto negativo, que
cresce com uma rapidez igualmente inimaginável!
Eu
explorei mais o segundo aspecto do termo, abordando três
pontos principais:
a)
A ambivalência do termo segundo André Joos, justamente
para fazer ver como a globalização vai num sentido e
noutro.
b)
Riscos ou intenção velada da globalização? De facto,
ela parece ser uma grande descoberta para acabar com os
problemas da pobreza global, mas mostra sobretudo ser
uma estratégia para engolir os mais fracos. Por ex.,
nos anos '60 o capital das principais 200 multinacionais
era de 16% do inteiro produto nacional bruto de todo o
mundo, nos anos '80 esta percentagem subiu para 24% e em
1995 já tinha atingido os 34%. Segundo algumas estatísticas
da ONU, as multinacionais são 40.000 e controlam
250.000 sociedades. 80% delas tem sede nos Países do
Norte, mas acima de 50% das sociedades controladas estão
no Sul. São de grande peso económico, e 600
multinacionais (1,5% do total) controlam sòzinhas 50%
da produção industrial mundial.
Para
G. Martirani, o Norte do mundo é o dragão, isto é: as
multinacionais, que hoje têm um poder económico
superior ao dos Estados; é o "polvo" das máfias
do mundo, com um poder financeiro ainda superior ao das
multinacionais; são os quatro cavaleiros do Apocalipse,
hoje, como há dois mil anos: fome, invasão, guerra e
morte; são as actuais emigrações, a usura e a dívida
externa; é o abismo enorme que separa os povos obesos
dos esquelécticos; é o comércio das mulheres, o
turismo das transplantações de órgãos vitais e o comércio
sexual; é a exploração de milhões de crianças
mini-escravas; é a degradação ambiental que corre o
risco de comprometer a própria vida do planeta; é o
fogo das guerras.
Neste
processo assim não só se escavou ainda mais o abismo
entre "os que têm" (o Norte) e "os que não
têm" (o Sul), mas o número dos pobres aumentou
enormemente, estando ameaçada a sociedade civil e
tornando os próprios governos cada vez mais dependentes.
c)
Um vazio ético inadequadamente preenchido, no sentido
de haver algumas responsabilidades eclesiais em relação
ao endereço tomado. Certos atrasos na colocação dos
problemas éticos levaram a que outros oferecessem ao
mundo uma proposta que resulta hoje não ser a melhor. Nós
(as Igrejas cristãs pelo menos) gostamos de 'certezas',
mas acabamos por aceitar na mesma, só que tarde, quando
as coisas já estão endereçadas à sua maneira!
O
capítulo segundo avança com a argumentação de como
vem tratado nesta linha o Sul do mundo, que já não é
propriamente geográfico mas humano e económico, isto
é, a contra-mão da opulência. Pois bem: reduz-se
drasticamente a população do Sul (segundo Ricardo
Cascioli trata-se de um verdadeiro "complot demográfico")
e os restantes são escravizados pela falsa mas interminável
dívida externa secundada pela prática injusta do comércio
internacional. Neste quadro podem ser alarmantes para o
futuro do mesmo Sul as manipulações da engenharia genética,
por um lado, e as ideologias de pobreza e
desenvolvimento, por outro. É uma máquina fortemente
montada, de proporções talvez piores do que a máquina
colonial. De facto, as bases em que assenta o novo fenómeno
da globalização assemleham-se às que precederam
outrora a colonização, o que leva a suspeitar se não
se estarão a criar outros precedentes para uma
recolonização, que alguns já sustentam abertamente
apoiados na persistente instabilidade reinante nos países
pobres sobretudo a África. Como na globalização conta
o mercado, e este consiste nas relações de troca,
todos os que não têm contrapartida ficam excluídos,
deixados deteriorar e posteriormente abandonados para o
seu desaparecimento. O princípio é: "quem não
está (dentro) já nunca mais estará; e é melhor estar
dentro do que fora". A exploração de ontem é
susbtituída pela exclusão, que é ainda pior. Não será
o caso de Angola, por ex., porque é muito rica, mas põe-se-lhe
na situação de um desfuncionamento incontrolável para
facilitar a hipotecação das riquezas por períodos
mais longos (30-40 anos).
Este
capítulo segundo, portanto, analiza as verdadeiras
intenções da teoria sobre o excesso da população
mundial; a dívida externa como instrumento de controlo
político para escravizar hoje os pobres do mundo; e as
ideologias de pobreza e desenvolvimento com as quais
fingidamente o Norte se apresenta no Sul do mundo para
dominá-lo.
O
terceiro capítulo é aplicado concretamente ao caso de
Angola, isto é, o actual conflito não estará (simplesmente)
a 'limpar' melhor o caminho para os objectivos nefastos
do gigante 'global', que avança contra tudo e todos? O
capítulo tem um título irónico: "A guerra contra
a pobreza terminou e os pobres perderam"... e
morreram! O pior de tudo é que o mal-estar no Sul está
'programado', o mesmo é dizer, tudo afinal é querido e
procurado, "o que faz compreender melhor a razão
pela qual na Europa e nos Estados Unidos não há
verdadeiro interesse para resolver os problemas
africanos", em particular, e do Terceiro Mundo, em
geral. È para que em tudo "os pobres percam as
batalhas todas e morram"?!
Aparece
aqui quase des-situada mas muito bem endereçada a referência
à tecnologia multimedial, no sentido de que para uma
Angola diferente ela podia certamente ajudar a construir
um homem novo que não olhe mais (ou pelo menos
demasiadamente) para o passado de divisões e rancores,
de fingimentos e apatias, mas se projecte para diante em
ordem a um futuro risonho sem preconceitos nem tempo
para vinganças e desumanidades ultrapassadas pela
telecomunicação e satelização, etc. È interessante
ver como se entenderia a Internet: na nova projecção
ela deveria inspirar criatividade, espírito de abertura
e flexibilidade nas ideias. O Web, por seu lado, deveria
ajudar as pessoas a crescer na tolerância, convivência
pacífica e solidariedade!
No
quarto capítulo falo do lugar das Igrejas cristãs
neste processo da globalização no sentido positivo:
confrontadas com o que eu chamo "agitação global"
(difícil entendimento na "opinião pública";
milhões de vítimas no mercado mundial; estado de
alarme em "toda a aldeia"), elas podem sim
contribuir validamente para a paz no mundo que assente
na justiça e equidade, mas a sua nova presença é no
"diálogo público" no sentido de se assumirem
na sequela Christi, consciencializando e engajando os
povos "com doçura e respeito" (1 Pe 3,15) na
abordagem de questões de interesse comum. Neste último
capítulo, termino citando Madre Teresa de Calcutá,
cuja expressão traduz bem a fidelidade e o amor dos
verdadeiros pastores do rebanho de Deus (Jo 10,1-11.14),
que é, no caso, cada povo e todos os povos: "amar
até doer!" Quer dizer, os guias comunitários (desde
os bispos até aos agentes de pastoral), se for o caso,
poderão dar a vida para que as ovelhas não sejam
destruídas e dispersas.
Em
cada país em conflito no Sul, e pedindo todos perdão
pelos muitos pecados contra a paz e reconciliação
nacional, as acções concretas a dinamizar no futuro
poderiam ser nos rastos do Jubileu 2000: "proclamar
a paz", restituindo a liberdade a cada um e
distribuindo equitativamente as propriedades nacionais
pelos seus respectivos filhos. Seria a melhor maneira de
garantir a estabilidade de cada Nação e o bem-estar de
todos os povos!
Na
era do projecto e do futuro, a globalização pode-se
considerar efectivamente um projecto de futuro a
'monitorar' variadíssimas intenções. E em relação
às más intenções, a obra procura mostrar como se
trata de uma autêntica guerra generalizada do Norte
contra o Sul na qual os verdadeiros ideólogos sustentam
que a "vida" de uns (os ricos) depende da
"morte" de outros (os pobres). Face a isto,
alguns números do 'programado' mal-estar no Sul são já
chocantes e desesperadores: guerras constantes, fomes
prolongadas, doenças manipuladas, mortes cruéis, etc.
Ironicamente, porém, os pobres 'devem entender' que
disso depende 'também' o futuro dos outros, os ricos! E
mesmo que alguns políticos do Sul não "jogassem
às cegas", isto é, não continuassem a simular
que não estivessem a ver as coisas, o maior desgosto
que sentem os já desgraçados é que, como estão
montadas as coisas, no fim de tanta "guerra contra
a pobreza" sejam ainda "eles a perdê-la"!
Não valerá para nada todo o esforço a empenhar?
André
Lukamba
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